Redescobrindo a poesia de Yeats
“Oh, Rocky Voice, shall we in that great night rejoice? – Oh, Voz das Rochas, haveremos de nos alegrar naquela grande noite?”
W.B. Yeats
Queridos(as) leitores(as), muito já se comentou sobre William Butler Yeats (1865-1939), o excepcional poeta irlandês que dividiu com Rudyard Kipling o Prêmio Gothenburg em 1934, e ganhou o Nobel de Literatura em 1923. A poesia de Yeats é extraordinária, embora seus temas – principalmente os da fase inicial – estivessem um pouco imbricados de mitologia e folclore irlandês, o que não deixa de ser perfeitamente normal para a época. No tocante à mitologia, Yeats recebeu forte oposição de seu pai e amigos no que diz respeito ao seu interesse pelo hermetismo e ciências esotéricas.
Obviamente, não há espaço aqui para debater a obra de Yeats mais detalhadamente; porém gostaria de comentar duas de suas poesias que expõem sua forte tendência mística, que foi causa de vergastadas implacáveis de opositores, principalmente W. H. Auden que caracterizou sua última fase poética de ‘espetáculo deplorável’. Mas, é justamente aí que a coisa fica boa, pois a esta altura de sua vida os questionamentos são agudos, como que pressionados pela inevitável procura de sentido de um homem que está a enfrentar sua própria morte. Senão, vejamos dois exemplos.
Em 1899, Yeats escreve To My Heart, Bidding It Have No Fear – Para o meu coração, Não tenha medo: Be you still, be you still, trembling heart / Remember the wisdom out of the old days: / Him who trembles before the flame and the flood / And the winds that blow through the starry ways / Let the starry winds and the flame and the flood / Cover over and hide, for he has no part / With the proud, majestical multitude. Vamos à tradução: Fica quieto, quieto, trêmulo coração; / Lembra a sabedoria que vem dos velhos dias: / Aquele que treme ante a chama e a cheia, / E os ventos que sopram pelas vias estreladas, / Deixa que os ventos estrelados e a chama e a cheia / Encubram e ocultem, pois ele não faz parte / Da orgulhosa, majestosa multidão.
Parece ser fora de questão que o termo ‘velhos dias’ supracitado é uma referência de Yeats ao seu interesse pelas ciências esotéricas às quais já nos referimos, e que foi motivo de forte oposição a Yeats, inclusive de seu próprio pai. O poeta aqui é implacável com aqueles que vivem com medo dos elementos naturais (Aquele que treme ante a chama e a cheia / fogo, enchente, furacões). Esses deveriam ser tragados por eles, pois não são capazes de desfrutar da companhia da orgulhosa, majestosa multidão de espectros, espíritos e fantasmas com os quais Yeats buscava incessantemente se comunicar neste período.
Façamos um corte no tempo e sigamos imediatamente para o ano anterior à morte de Yeats. Aqui ele escreve The Man and The Ecco – O Homem e o Eco, poema agudo no qual contempla sua própria morte. Como representante da humanidade o poeta lança um brado angustiado sobre o que existe ‘além túmulo’; dizendo: “Oh, Rocky Voice, / Shall we in that great night rejoice? / What do we know but that we face one another in this place? / But hush, for I have lost the theme, / Its joy or night-seem but a dream; / Up there some hawk or owl has struck, / Dropping out of sky or rock, / A sticken rabbit is crying out, / And its cry distracts my thought. E a tradução: Oh, Voz das Rochas, / Haveremos de nos alegrar naquela grande noite? / O que sabemos, senão que encaramos um ao outro neste lugar? / Mas silêncio, pois eu esqueci o tema, / Sua alegria ou escuridão parecem apenas um sonho; / Lá em cima um gavião ou uma coruja se arremessou, / Despencando do céu ou do penhasco, / Um coelho ferido geme, / E seu gemido perturba meu pensamento.
Aqui, há que se concordar com Cornwell que existe o confronto de vários ‘temas’; mas de forma geral o poeta, agindo em nome da humanidade consulta o Oráculo sobre o que existe no ‘ além’. E nós? Haveremos de nos alegrar por aceitar a grande noite de aniquilação trazida pela morte? Encontraremos alegria na vida após a morte? Quais as respostas? Não há! Somente o eco questionador da própria humanidade. A única certeza, para Yeats, é a dos relacionamentos humanos enquanto ‘encaramos um ao outro neste lugar’.
Para Cornwell, o poeta conclui que a humanidade pode pensar, sonhar, perguntar, especular... Mas a única certeza absoluta é a dos relacionamentos humanos acompanhados do problema insolúvel da natureza violenta e sofredora. E a estas meditações não somos poupados também nós que professamos abertamente uma atitude religiosa.
Um fraterno abraço e um ótimo final de semana.
Fiquem com Deus!